#ArteviewNaPlateia – Review de Shakespeare Apaixonado no 033 Rooftop

Por Léo Braga

Desapegar é difícil, não é mesmo? Nós, brasileiros, precisamos deixar de lado o ranço gerado por ‘Shakespeare Apaixonado‘ naquele momento em que Gwyneth Paltrow foi anunciada como vencedora do Oscar de melhor atriz em 1999, deixando o Brasil inteiro em choque. Porque, é claro, Fernanda Montenegro estava (e sempre estará) milhões de anos-luz à frente em ‘Central do Brasil‘ do que Paltrow em ‘Shakespeare Apaixonado’ – e isso nem é exagero.

O filme também ganhou o prêmio de melhor filme naquele dia, mas este texto não é sobre cinema.

Quando o Atelier de Cultura anunciou a montagem da adaptação do filme para os palcos, fiquei bastante curioso. Apesar de tudo, faço parte daqueles que gostam do filme. Mas não tinha ideia de como ele seria adaptado para o teatro de uma forma que fosse interessante o suficiente para prender o público.

Para quem não conhece a história, lá vai: 

William (Rodrigo Simas) recebe dinheiro para escrever uma peça, mas está em meio a um bloqueio criativo e só encontra inspiração quando conhece a jovem Viola (Carla Salle), que sonha em atuar em uma Inglaterra onde apenas homens podem exercer tal ofício.

Esperei alguns dias após a estreia para assistir. Fui a uma matinê de domingo e, por isso, a personagem da Rainha Elizabeth I, normalmente interpretada por Dona Ana Lúcia Torre, foi interpretada (com muita elegância) por Julia Corrêa – sendo também possível assistir à encenação com Neusa Romano no papel.

Subi ao 033 Rooftop pouco antes do terceiro sinal soar e fui direcionado ao meu assento, na terceira fileira da Plateia VIP Shakespeare, uma arquibancada situada exatamente de frente para o palco. No entanto, à frente dessa plateia, ainda há duas fileiras de mesas mais VIPs.

O espaço cênico é como uma arena retangular, com plateia em três lados e, no quarto lado, um palco com um cenário de dois andares, sendo o segundo andar um balcão (ou varanda). Acredito que o balcão seja menos funcional do que se espera, pois, sentado na terceira fileira, eu não conseguia ver a cabeça dos atores que estavam ali, mesmo tentando abaixar a minha. Tirando esse detalhe, o cenário assinado por André Cortez é belíssimo, e podemos ver que é muito bem feito e acabado.

Embora amplamente divulgada como uma peça imersiva, pouco acontece que realmente passe essa impressão. Em alguns momentos, os atores entram e saem de cena pelo meio da plateia, mas não há cenas acontecendo ao redor dos espectadores – e aposto que isso é muito melhor do que fazer todo mundo se contorcer nas cadeiras para tentar ver onde o ator está.

Com um elenco grande (mais de 20 atores em cena), seria fácil que alguns se desconectassem do restante, mas o que vemos é um elenco entregue e uno, com destaque para a dupla que interpreta o Lorde Wessex e Ama – Gustavo Vaz e Fafá Rennó, respectivamente.

Durante a sessão, ainda no 1º ato, houve uma queda de energia no meio de uma cena entre Viola e Lord Wessex. Com humor, o ator terminou sua fala, fez uma piada sobre conta de energia não paga, e a peça foi paralisada por longos minutos. Com a energia restabelecida, aos poucos vimos o teatro ganhar vida novamente: luzes acesas, microfones funcionando, e instrumentos prontos (não é um musical, mas há música ao vivo – e de qualidade – sob a direção musical de Rodrigo Hyppolito).

Atores de volta ao palco. Eu imaginei que pudessem titubear ou diminuir a energia do espetáculo, mas não foi o caso. Gustavo Vaz e Fafá Rennó, que jogam muito bem juntos, não tiveram dificuldade em elevar o ritmo da peça acima do que víamos antes da queda de luz, e o espetáculo foi ficando cada vez melhor.

Por vezes, os microfones não estavam ligados quando um ou outro personagem ia dar sua fala, mas mesmo assim, isso não impediu que o público ouvisse claramente o que era dito. É importante lembrar que falhas em microfones acontecem e não comprometem o excelente trabalho de design de som de Gabriel D’Angelo.

Durante o segundo ato, consegui me sentar em outro lugar: nas mesas. Dali, temos uma visão completa do balcão e dos atores que estão ali. Assim, ao somarmos o cenário ao belíssimo figurino (de Ligia Rocha, Marco Pacheco e Jemima Tuany) e às perucas muito bem feitas (por Feliciano San Roman), temos a sensação de estar viajando de camarote – ou de plateia – para uma era elisabetana. Acho que é aqui que reside a verdadeira imersão.

Voltando ao elenco, é impossível não mencionar Lucas Bocalon e Luiza Porto, que cantam um número musical em segundo plano diretamente do balcão, enquanto uma cena acontece em um barco na boca de cena. É um momento em que quase se perde o foco da história para prestar atenção apenas na beleza do que está acontecendo no balcão.

Eu duvido que, depois de assistir a esta encenação, você continue tendo algum problema com a fatídica noite de 1999. Rafael Gomes não apenas faz um excelente trabalho ao adaptar o espetáculo para o português, mas com uma direção impecável, nos guia por uma bela história que transforma a paixão em uma experiência inesquecível.

SERVIÇO:

Até 22 de setembro de 2024

Horários:
Quintas e sextas-feiras, às 19h30
Sábados e domingos às 15h00 e às 19h30
Ingressos: de R$19,80 a R$290,00

Sessões com intérprete de Libras e serviço de audiodescrição:
Sexta-feira 13/09 – 19h30
Domingo 22/09 – 15h00

O espaço possui acesso para pessoas com deficiência

Duração: 150 minutos com 15 minutos de intervalo
Capacidade: 421 pessoas